sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Juventude em Marcha

Vou falar com desconfiança sobre as marchas, porém não ofereço nada melhor em seu lugar, pois entre ficar no 0 x 0 e fazer gol contra prefiro a primeira opção, até que chegue o momento do jogo em que as condições estejam favoráveis para que meu time consiga fazer um gol chorado.

Flashback: A maior parte dos guerrilheiros que lutaram contra a ditadura brasileira depois tomou consciência de que eles cometeram um erro estratégico. Foi glorioso pegar em armas (e era a glória que movia pessoas como Brizola ou Prestes, eles sabiam que não podiam ganhar), porém nada de positivo foi alcançado. Nem o tempo revelou qual era a verdadeira saída, e o curto período de durabilidade de um ser humano dificulta que este esteja preparado para compreender as coisas de maneira profunda. Em raríssimas vezes a verdade se abre assim, como um relâmpago que rasga a cortina de mentiras na qual vivemos presos, porém já é tarde demais: tal privilégio já encontra o agraciado sem suas forças vitais principais; sem a força mais potente da juventude.


As marchas estão na moda. Assim como todas as modas, devem ser vistas sob olhos críticos, pois modas no geral são assimiladas de forma quase que automática, às vezes sem que o desejo de adesão a ela parta do interior do indivíduo. Ao contrário, as modas costumam vir do exterior, e seu mecanismo de ação não difere muito do binômio "palavras de ordem - ação de acordo com tal ordem", que invariavelmente também envolve o binômio "sujeito que manda - sujeito que obedece".

Existe hoje muito alarde em torno do fenômeno no Egito e da Primavera Líbia, e depois no Chile, e finalmente, a onda chegou ao Brasil. Liberação da Maconha, melhorias na educação, gritos de guerra contra a corrupção. Diferentemente dos casos norte-africanos, falta aqui um ingrediente básico em qualquer tipo de revolta: a violência (não necessariamente física, mas principalmente, ética, mental).

Faz parte da cultura brasileira a tendência a evitar o conflito e o desconforto, pois no país o que impera é a mentalidade da auto-preservação a qualquer custo, mesmo que tal custo seja se abster da responsabilidade sobre as coisas. Tal abstenção não existe sem o desenvolvimento de uma má consciência, uma espécia de "culpa" (um valor católico, e o Brasil ainda é um país católico no que diz respeito a seus valores morais), cujo alívio finalmente pode ser fornecido pela participação nas marchas. É uma forma da pessoa sentir que está contribuindo para a resolução do problema e, mais importante do que isso, "lavar as mãos". "Sou consciente do problema, a culpa não é minha, fiz minha parte e agora estou mandando esse spam para recrutar mais pessoas". Pronto! O sujeito agora sente-se um pouco mais aliviado e acredita que cumpriu seu papel, e é aí que mora o problema: cumprir o papel.

Sempre, em todos os lugares e tempos, populações se manifestaram contra ou a favor disso ou daquilo. Nas raras vezes onde algo foi conseguido "graças ao povo que não consentiu calado", se analisarmos a situação de forma séria (não superficialmente), veremos que o povo nada mais foi do que massa de manobra. Revolução francesa, russa, a recente egípcia: o povo nesses casos pegou em armas, mas isso não quer dizer que ele está no comando. Há sempre a mão invisível que manipula o povo em direção ao que lhe convém, geralmente são futuros líderes insurgidos que, passado o clima inflamado da revolução, se sentam confortavelmente em seus postos de comando e podem desfrutar daquilo que eles realmente almejam: o poder.

A título de exemplo, não podemos nunca esquecer que um político como José Serra passou pela presidência da UNE. Depois, foi o homem da saúde na era fhc. Depois, quis ser presidente do Brasil. Educação, Saúde, Povo Brasileiro: tudo são bandeiras substituíveis no momento em que estas não mais o servem para a sua escalada rumo ao topo; são como adesivos de carro facilmente trocáveis. Carreiristas! Este tipo é um dos mais perigosos. Deve-se, portanto, olhar com desconfiança aqueles que são líderes.

Pois bem, a recente Marcha da Corrupção deve ter sido muito divertida, mas, em termos práticos, é inútil para os fins a que ela se propõe a resolver. Ela é útil apenas para a auto-promoção dos indivíduos que às custas dela angariaram destaque individual. Em todo caso, os políticos corruptos seguem vivendo tranquilamente, como sempre viveram, e desconfio que eles adoram as marchas e assistem a elas em seus camarotes comendo pipoca, pois como comentei no início, o aumento do número de marchas significa menos gente potencialmente perigosa para eles no meio do povo. Às vezes, a arma que nos é oferecida é na verdade o anestésico. Às vezes, o remédio na verdade é veneno.

Quem realmente oferece perigo ao sistema deve, por regra, permanecer fora dele, ou melhor, nas suas margens. Não por opção, mas pela própria natureza do sistema, que não permite que nenhum evento ocorra em seu centro sem que dele possa se beneficiar. Portanto, é necessário que busquemos outros papéis para desempenhar, sejam eles mais ou menos violentos, mais ou menos gloriosos: o que importa é construir ou destruir. Afinal, quem quer reclamar e liga para o SAC acaba descobrindo (tarde demais) que tal departamento existe justamente para oferecer um orelhão para o cliente desabafar e ficar pianinho. Protestar, portanto, não é suficiente. Nunca foi.

Um comentário:

  1. opa! Watalandia atualizada!!! É um caso a se pensar, nunca tinha visto a situação por este ponto de vista. Mas afinal o que é melhor? Marchar ou não marchar? Acho que mesmo com todos esses contras, a marcha vale mais a pena do que ficar em casa...

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